BAÚ LITERÁRIO

Tratam-se de textos ( resumos de ensaios) que são publicados a cada 15 dias no suplemento literário da Academia Goiana de Letras ( encarte do jornal Diário da Manhã de Goiânia)

quarta-feira, 7 de julho de 2010

FREUD INICIA SUA AUTOANÁLISE E A INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS – VI

O Prof. Jean Martin Charcot, naquela época um dos mais famosos neurologistas do mundo, diretor do Asilo Salpêtrière de Paris, com quem Freud teve oportunidade de estagiar por quase seis meses (1885-1886), deixou marcas indeléveis na evolução dos estudos sobre os distúrbios do psiquismo em que Freud estava envolvido.
Ao lado de frisar a importância dos conhecimentos que adquiriu, estando ao lado de Charcot, Freud deu demonstração de independência crítica ao não concordar com tudo o que ouvia do Mestre, como ficou patenteado no prefácio do livro “Conferências das terças-feiras de Charcot” que ele traduziu do francês para o alemão.
Além de tecer elogios ao Professor, “ essas conferências encerram material novo que ninguém, nem mesmo os especialistas no assunto, as lerá sem um considerável acréscimo em seus conhecimentos”, Freud foi também crítico, ao justificar as notas que ele acrescentou no rodapé do texto que traduziu, em que ele diz, textualmente: “ Essas notas são de minha autoria... em parte são objeções e anotações críticas, tais como as que podem ocorrer a quem está ouvindo uma conferência... simplesmente estou pretendendo exercer o direito de criticar... É evidente que o faço segundo meu próprio ponto de vista, na medida em que este diverge das teorias de Salpêtrière (Sigmund Freud – Vol. I, Ed. Imago, 1996)”.
Freud tinha consciência que Charcot, com o uso da hipnose, havia dado o primeiro passo no sentido da humanização do tratamento das neuroses, porém esta técnica e a sua própria, denominada “técnica de pressão”, continuavam, sob seu ponto de vista, sendo arbitrárias e autoritárias.
Achava, também, que a sua nova técnica “Livre associação de idéias”, ao buscar no passado do inconsciente, os eventos traumáticos que estavam causando os sintomas, poderia ser a chave para solucionar a problemática dos distúrbios neuróticos.
Pela sua honestidade intelectual, Freud se deu conta que precisava testar em si mesmo, para provar se as hipóteses que aventava acerca do funcionamento da mente eram realmente corretas e aplicáveis a outros; se os fenômenos que via nos seus pacientes não poderiam ser, simplesmente, distorções do funcionamento psíquico de todos os homens e não somente daquele paciente em particular.
Em 1897 ele iniciou uma proeza única e ainda insuperável: a autoanálise.
Concomitantemente com esta decisão ou por causa desta, ele resolveu interpretar seus próprios sonhos; o primeiro, não obrigatoriamente na ordem cronológica dos acontecimentos, porém, no registro bibliográfico do livro “Interpretação dos sonhos” que ele publicou em 1900, foi o sonho “Injeção de Irma” e que foi o marco inicial da revelação do mistério dos sonhos, conforme ele escreveu para seu amigo Dr. Fliess em 24.7.1895 (Correspondência Freud e Fliess, Ed. Imago, 1986).
Ao analisar este sonho ele considerou as associações de cada elemento do mesmo, comparando, cuidadosamente, com outros acontecimentos e descobriu como são as elaborações oníricas. Chegou a esta conclusão pela análise de outros seus sonhos e também dos seus pacientes.
Em uma carta que ele enviou ao seu amigo Fliess, Freud dá mostra, mais uma vez, da sua intelectualidade (texto maravilhoso) e da sua visão quanto ao futuro da sua nova descoberta; diz ele “... A autoanálise pode ser comparada à situação de um explorador que se abala à sua viagem sem saber de sua destinação, não tendo em seu equipamento nem mapas, nem bússolas, inseguro a respeito dos instrumentos de que irá precisar na sua caminhada...”.
Os especialistas em psicanálise sabem que um dos mais importantes ingredientes de toda análise é a “transferência”; o analisando desenvolve um relacionamento muito especial em relação ao analista que reflete todos os seus intensos relacionamentos a figuras importantes do passado – pais e irmãos.
Esta relação de transferência é essencialmente uma repetição do passado; Freud era seu próprio analista e o elemento de transferência passou a ser seu amigo Dr. Fliess.
No próximo capítulo iremos discutir este relacionamento e, sobretudo, esta “transferência”.

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