BAÚ LITERÁRIO

Tratam-se de textos ( resumos de ensaios) que são publicados a cada 15 dias no suplemento literário da Academia Goiana de Letras ( encarte do jornal Diário da Manhã de Goiânia)

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O NASCIMENTO DA PSICANÁLISE - Capítulo IV -


Ao analisarmos a vida social, política e social da Áustria do meio para o final do século XIX, podemos entender a dificuldade para a aceitação das novas idéias que estavam sendo propostas por Freud, principalmente sua coragem em discutir a sexualidade como imbricamento de alterações da esfera psicológica.
Viena, a capital da dinastia dos Habsburgo, era considerada a metrópole de todos os povos da Europa central, situada a meio caminho entre o ocidente e o império Otomano, era habitada por uma heterogênea comunidade de Alemães, Húngaros, Poloneses, Tchecos, Croatas, Romenos e Ucranianos, tendo o Imperador como elemento de mediação desta complexa mistura de raças.
Desde 1867, com o coroamento de Francisco José em Budapeste, o Império Austro/Húngaro conseguia sobreviver ao desafio da manutenção desta tênue união, embora a Áustria com seus territórios feudais (Boemia, Moravia e Galícia) e Hungria (Croácia, Transilvânia, Eslováquia), gozassem de autonomia política, inclusive com seus respectivos parlamentos.
Analisando a bibliografia que tive acesso (Cartas, artigos, biografias, etc.), não percebi, em nenhum momento, qualquer envolvimento de Freud com a política, com as artes, muito menos com a musica e a ópera, que eram as paixões dos Vienenses; pelo contrário, conseguimos visualizá-lo bem distante da classe de intelectuais (escritores, pintores).
Freud nasceu em 1856 e quase que na mesma época nasceram, também, Victor Adler, grande líder político, Alois Riegl, fundador da escola Vienense de história da arte, o musicista Gustav Mahler, Gustav Klimt, pertencente à vanguarda modernista, Arthur Schnitzler, médico e escritor; naquela época Viena contava com cerca de 500.000 habitantes, portanto com grande probabilidade de se conhecerem mutuamente e, talvez, se aproximarem.
A não ser algumas incursões sobre a posição antissemita do prefeito Lueger e quando do caso Dreyfus na França, parece-nos, à distância, que Freud era um partidário do slogan “ciência pela ciência” como colorário do conhecido “arte pela arte”.
Não circula pelos ambientes aristocráticos dos cafés de Viena, é um cientista que se debate com grande dificuldade econômica para viver; para não ficarmos apenas com o raciocínio de debitar todo o retraimento de Freud ao problema financeiro, precisamos ter em conta que estamos lidando com um gênio da humanidade e, provavelmente, ele poderia repetir com o prêmio Nobel de literatura, seu conterrâneo, escritor Hermann Broch: “A Áustria do século XIX, não apenas no domínio intelectual, mas, também no campo político, havia se tornado um Estado bom para ser guardado no museu”, e, como conseqüência não tivesse, também, interesse pela vida mundana da sua cidade.
Por outro lado, ele estava muito envolvido com a evolução da sua nova descoberta, a psicanálise; em pouco tempo ele se conscientizou que a maneira de aplicá-la, como vinha fazendo (questionamentos ao paciente enquanto fazia pressão com as mãos sobre a sua nuca) funcionava como um elemento de pressão psicológica e o pior, as respostas eram pontuais às perguntas que eram feitas.
Baseado nestas observações, Freud passou a utilizar uma nova técnica que ele denominou de “livre associação” – o paciente deveria falar tudo o que lhe interessava falar, sem a interferência do médico, que apenas ouvia.
Depois do seu afastamento cientifico com o Dr. Breur, Freud ficou com poucos interlocutores; por esta época ele se aproximou de um médico Berlinense, especialista em otorrinolaringologia, de nome Wilhelm Fliess, com quem passou a manter constante correspondência e com quem poderia trocar idéias a respeito da sua descoberta e do seu isolamento científico.
“abril, 1896. Querido Fliess ...Uma palestra sobre etiologia da histeria teve uma recepção gélida por parte daqueles imbecís, é isto, depois de se ter demonstrado a eles a solução de um problema de mais de mil anos; pois que vão para o inferno!”
“ Maio de 1896, Querido Fliess... Estou isolado. Alguém deu instruções para que eu fosse abandonado, pois um vazio está se formando a meu redor... meu consultório está vazio, por semanas a fio não vejo nenhum rosto novo” – Correspondência Completa de Freud e Fliess, Ed. Imago- RJ, 1986.
Discutiam, também, sobre suas dificuldades econômicas (muitos filhos, seus pais, sua esposa e sua cunhada para sustentar), sua nova teoria que ainda não era bem aceita pela clientela; ao lado disto, sua vida era toda envolvida com a evolução da sua nova ciência,
com pouco ou quase nenhum momento de lazer (aos sábados à tarde jogava cartas “tarô”, passeios pelos campos dos arredores e colecionando antiguidades)
Foi, também, por esta época (anos de 1890) que ele se deu conta da sua própria neurose, coincidindo, além disto, com o falecimento do seu pai, a quem ele era espiritualmente muito ligado.
Dois fatos muito importantes para a psicanálise ocorreram durante estes difíceis anos da vida de Freud: inicio da sua autoanálise e os primeiros passos na tentativa de fazer a Interpretação dos Sonhos.
Qual foi a técnica que ele utilizou para este desiderato será motivo do próximo capítulo.

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial