BAÚ LITERÁRIO

Tratam-se de textos ( resumos de ensaios) que são publicados a cada 15 dias no suplemento literário da Academia Goiana de Letras ( encarte do jornal Diário da Manhã de Goiânia)

quarta-feira, 7 de julho de 2010

FREUD É ACEITO COMO CATEDRÁTICO DA UNIVERSIDADE DE VIENA. - V

O intervalo compreendido entre os anos de 1897 e 1900 foram muito difíceis para o Império Austro-Húngaro, devido, principalmente, ao grande problema das múltiplas nacionalidades dentro do seu território e daí, como consequência das discussões étnicas, surgiram conflitos sobre a definição do idioma oficial de cada um destes grupos, paralisando completamente o governo.
O Parlamento era obstruído ora pelos parlamentares alemães ora pelos tchecos, impossibilitando, por isto, a formação de Ministérios; a Monarquia que, a partir de 1867, havia abandonado o regime absolutista e iniciado a era constitucional, com a instituição do “Ministério dos cidadãos”, se viu obrigada a suspender, em 1900, esta maneira de governar e instituiu o chamado “Ministério dos Burocratas”.
Entregou a incumbência da formação deste novo Ministério a um homem considerado competente e imaginativo, Ernest Koerber, que passou a governar o Império por meio de decretos enquanto procurava uma solução para o imbróglio político.
Verificou que duas vertentes da vida austríaca poderiam, pela repercussão das suas ações e pelos interesses comuns de todos os cidadãos do Império, alcançar seu desiderato de acalmar a vida política: a área econômica e a cultural.
Verificou, também, que culturalmente era importante o Estado apoiar a corrente do “modernismo” que já emitia sinais de presença no interior da fronteira austríaca, onde os grupos nacionalistas estavam desenvolvendo artes étnicas separadas; os modernistas, no entanto, tomavam caminho oposto, abrindo o trânsito na Áustria para as correntes universalistas do pensamento europeu.
Ao lado desta problemática, que palidamente desenhamos havia, ainda, nos albores do século XX, pairando no horizonte, uma nuvem de preocupação quanto ao problema de hostilidades entre as nações que poderiam desembocar em novo conflito armado.
Foi, provavelmente, pensando nisto que O Czar Nicolau II da Rússia provocou a segunda reunião da Convenção de Haia na Holanda (1899), quando se procurou estabelecer algumas regras básicas para as guerras e catalogava alguns crimes de guerra.
Por esta época (1897), uma das grandes frustrações de Freud foi a não aceitação, por parte do Ministério da Cultura, da indicação feita pelo corpo docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Viena, para ele ocupar uma cátedra.
Em 1901 Freud convenceu seus “padrinhos” universitários a reabrirem o processo e, só agora, ele descobriu que precisaria da ajuda de alguém com acesso ao Ministro; procurou uma protetora e sua cliente, a Baronesa Marie Ferstel, esposa de um diplomata; esta prometeu ao Ministro a doação de uma valiosa pintura para a “Galeria de Arte”!
Em março de 1902, conta Freud, a Baronesa entra no seu consultório com a carta do Ministro, dando-lhe a boa nova:
- Freud foi, finalmente, nomeado catedrático da Universidade de Viena!
A partir da eleição de Lueger, antissemita confesso, para a prefeitura de Viena (1895) Freud passou a viver isolado da sociedade, além de estar profissionalmente frustrado, ocupando-se, quase que tão somente, da elaboração da sua obra que marcaria época: “A Interpretação dos sonhos” pois entendia aquela recusa do governo em nomeá-lo para a cátedra, ao fato de ser judeu.
Provavelmente ele tinha alguma razão, porém, não podemos ser tão reducionista para aceitar, como única razão para suas dificuldades, o problema racial; havia, desde 1890, um inicio de confrontação de classes dentro do Império e o que era antes uma luta de idéias entre liberais versus conservadores, passou a ter a participação de estratos sociais das classes inferiores que geravam forças para contestar o poder das elites mais antigas.
Da classe operária surgiu o socialismo, da classe média o nacionalismo e o socialismo cristão virulento nas refregas sociais.
A eleição de Lueger foi um golpe, não somente contra os judeus, mas, também, contra a classe cultural liberal que não aceitava a tutela das idéias.
Para corroborar esta nossa afirmativa, invoco o historiador Carl Schorske (Viena fin-de-Siecle, Cia. das Letras, 1989):
“Nos anos de 1895 a 1900, quando Freud, socialmente retirado e profissionalmente frustrado, trabalhava na sua Interpretação dos Sonhos, obra que marcou sua época, Gustav Klimt estava engajado como explorador artístico num empreendimento muito diferente; Klimt liderava um grupo de artistas heréticos.
No entanto, ambos tinham muito em comum; colocaram uma crise pessoal de meia idade a serviço de uma reorientação radical do seu trabalho profissional, ambos soltaram as amarras biológicas e anatômicas dos campos que escolheram – a psicologia e a arte.
Quando apresentaram ao público os resultados de suas explorações, encontraram, em graus variados, a resistência de dois setores: a ortodoxia acadêmica liberal-racionalista e os antissemitas.
Ambos se retiraram da vida pública, abrigando-se no círculo dos que lhe eram fiéis, para preservar o novo terreno que tinham conquistado”
Klimt foi um dos mais famosos pintores simbolistas austríacos; em 1897 fundou e presidiu o movimento por ele denominado “Secessão”, equivalente à art nouveau, ou rejeição das certezas do século XX, tendo como lema: “À época sua arte, à arte sua liberdade”.
Esta rebeldia teria um preço! Quando Klimt foi escolhido para a cátedra na Academia de Belas Artes, o Ministério, contra todas as expectativas, não confirmou a indicação.
Depois de sua morte, uma de suas pinturas “Adele Bloch-Bauer I” foi comprada por uma galeria de Nova York, por cento e trinta e cinco milhões de dólares.
Gustav Klimt não era Judeu!
No próximo capítulo discutiremos a Interpretação dos Sonhos.




0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial